Desde que o mundo é mundo, a sociedade possui, talvez por instinto, a necessidade de eleger um líder. Alguém que responda e decida por todos o que é melhor para a convivência e evolução mútua. No futebol não é diferente. Aliás, o esporte nasceu (assim como todos os outros) com o objetivo de qualificar o melhor, seja equipe ou atleta.
A primeira partida oficial de futebol data de 1871, na Inglaterra. No mesmo ano, nasceu a FA Cup. Em 1873, surgiu a Scottish Cup. A ilha britânica era o único lugar onde a bola rolava, e um encontro entre os campeões das copas era o máximo alcançável para a época.
Assim, temos aí um primeiro esboço de uma competição “mundial”, enquanto o resto do mundo ainda descobria o encanto da bola de couro. Logicamente, a “FA versus Scottish” não tem nada que lembre um mundial, embora os vencedores se declarassem como tal.
Até a virada para o Século 20, toda a Europa e parte da América já batia sua bolinha. E em 1904, nasceu a FIFA. E quase junto com ela (em 1906), a primeira ideia de uma competição mundial. Mas ela não saiu do papel, pois o entendimento de alguns dirigentes da época era de que a entidade deveria cuidar exclusivamente de seleções nacionais (através do Torneio Olímpico, a partir de 1908), enquanto os clubes eram tarefa para as federações nacionais.
A FIFA não executava nenhuma competição mundial de clubes. No começo do século 20, duas tentativas independentes tiveram notoriedade, antes mesmo da criação: o Troféu Sir Thomas Lipton (entre 1909 e 1911) e a Copa Mitropa (entre 1927 e 1940). Todavia, existe um problema aí. Esses torneios eram exclusivos para europeus, e desde 1916 a bola era organizada na América do Sul pela Conmebol, a primeira entidade criada para atender a um continente. E foi ela que, em 1948, deu sinal verde para o Campeonato Sul-Americano, o primeiro esboço de um torneio internacional do Novo Mundo. Ainda não existia uma entidade europeia. Em 1949, a criação da Copa Latina daria impulso para a fundação da UEFA em 1954.
E o que o Sul-Americano e a Copa Latina possuíam em comum? Além de nascerem após a 2ª Guerra Mundial, foram elas o embrião da primeira competição verdadeiramente mundial, que fizeram clubes atravessar um oceano: a Copa Rio Internacional, em 1951. Vislumbrado com a organização brasileira da Copa do Mundo em 1950, Stanley Rous, vice-presidente da FIFA, costurou com a CBD a organização de uma copa do mundo versão clubes, com campeões nacionais. Sua organização foi aprovada por Jules Rimet, o presidente, mas um ponto negativo foram as desistências de Espanha, Inglaterra e Escócia.
A competição continuou para 1952, enfraquecida com mais desistências e sem a bênção da FIFA. A edição que seria a de 1953 virou um Torneio Rio-SP com Paraguai, Escócia e Portugal (a Copa Rivadavia Corrêa Meyer). O fato de o Brasil ter tido mais representantes que os outros (dois em 1951 e 1952, e quatro em 1953) também contribuiu para a ideia ser enterrada pelos 43 anos seguintes.
Em 1954, surge a UEFA. No ano seguinte, ela concebe a Copa dos Campeões Europeus (inspirada em todos os embriões já citados). Esta, por sua vez, inspirou a Conmebol a criar a Copa Libertadores em 1960. E logo de cara, as entidades conversaram para colocar seus campeões frente a frente, em jogos ida e volta. Nascia então a Copa Intercontinental. Sem a organização da FIFA, que apesar de fechar os olhos para o certame, tentou durante anos a inclusão das outras quatro confederações nele, sem sucesso. Mas o futebol ainda engatinhava nesses lugares. A Concacaf criou seu torneio em 1962, a CAF em 1965, a AFC em 1967 (parando em 1971 e voltando em 1985), e a OFC em 1987 (voltando depois em 1999).
A primeira tentativa de inclusão na Copa Intercontinental foi com Stanley Rous, em 1967. A segunda foi em 1970. Ambas elas apoiadas nos pedidos de Concacaf, CAF e AFC. A terceira tentativa foi em 1974, já com João Havelange. Em todas elas, UEFA e Conmebol rechaçaram a ideia em prol da qualidade técnica. A tentativa derradeira foi em 1993, e nesta vez a ideia avançou, sendo aprovada pelo comitê executivo da FIFA em 1996. À parte da Copa Intercontinental, a entidade teria seu próprio Mundial, em janeiro de 2000.
O Mundial da FIFA teve vida curtíssima, caindo por terra na edição cancelada de 2001. O pé de guerra entre FIFA e UEFA/Conmebol duraria até 2004, quando ambas cederam e uniram forças por meio da Toyota, o famoso patrocinador da Copa Intercontinental. Em 2005, nasceu o Mundial de Clubes, que sucedeu tudo e enfim expandiu a disputa europeia e sul-americana para todos os outros continentes.
No formato mata-mata, a FIFA manteve o Mundial de Clubes até 2023, quando a substituiu por dois novos torneios: a Copa Intercontinental e a Copa do Mundo de Clubes.
A Copa Intercontinental da FIFA estreou em 2024, em um formato similar ao anterior, com duas diferenças: no Mundial de Clubes, os campeões europeu e sul-americano estreavam na semifinal, enquanto que na nova competição, o representante da UEFA já está na decisão e o da Conmebol começa nas quartas de final. O nome pode até soar familiar, mas em nada tem a ver com o antigo certame.
Em 2025, a FIFA lançou uma terceira versão do Mundial, que acontece a cada quatro anos e com 32 equipes, tal qual a Copa do Mundo de seleções. O anúncio da Copa do Mundo de Clubes foi feito em 2022, com aprovação do formato realizado em 2023. Os campeões continentais dentro de cada ciclo quadrienal terão direito a disputar o torneio, além de times que podem se classificar via rankings de confederações. A UEFA tem direito a 12 vagas, contra seis da Conmbeol, quatro cada de Concacaf, CAF e AFC, e uma de OFC e país-sede.
E como fica a Copa Rio nessa história? Para muitos, essa ficou esquecida no tempo. Porém, é inegável que esta copa foi o primeiro tiro, o estopim para o futebol importar àquela necessidade que nasceu junto com a sociedade em se eleger um líder, de se apontar um melhor.